O gosto da vitória

O gosto da vitória

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Oração, ação e doação. Foi tudo que a médica reumatologista, Niedja Bezerra, recebeu ao longo do tratamento de um linfoma, um tipo de câncer que acomete células do sistema linfático e que passam a se desenvolver de forma anormal. Esse “tripé” que passou a receber da família, do marido Prisco Bezerra, dos filhos, e das amigas foi imprescindível para o sucesso no tratamento. Em janeiro deste ano, Niedja recebeu o diagnóstico de linfoma, junto com ele vieram os sentimentos de medo, as dúvidas e angústias. Mas “seu” tripé estava lá, e foi a base para conquistar suas vitórias: a cura da doença e a sua transformação pessoal.

A partir de sua experiência, a médica resolveu retribui todo esse apoio em forma de um livro, “Panapaná”, onde relata essa fase desafiadora da sua vida e com isso procura passar mais informações sobre a doença, o tratamento, e a cura, ajudando diretamente outros pacientes diagnosticados com linfoma com o Projeto Borboletas. “Não houve um só dia desse deserto em que eu estivesse sozinha. Foi amor em forma de caridade, de amizade, de proteção, de oração e de sublimação.

Após a minha cura, achei que o projeto era muito grandioso, eu diria fantástico, e que não poderia acabar em mim”, relembra Niedja Bezerra, que nessa entrevista nos conta sobre a difícil fase, o seu “Panapaná”, nos apresenta suas “Borboletas”, e nos presenteia com seu exemplo de crescimento pessoal e fé, o grande remédio para sua cura. Por Julyana Silveira

Revista Mulher Cheirosa – Como foi receber o diagnóstico de um câncer?

Niedja Bezerra – Esse é um momento de eco profundo do seu próprio eu. Parece um sinal de trânsito no qual você é obrigada a frear e decidir qual marcha utilizará dali em diante.

RMC – Por quais sensações passou ao longo do tratamento, sempre foi otimista ou teve momentos de medo?

NB – No início tive medo (de como encarar esse bicho de 7 cabeças), dúvidas (acerca do tratamento, possibilidade de cura e principalmente da quimioterapia, que hoje entendo ser uma aliada na busca da vitória) e angústias (do que poderia ter que passar), mas sempre fui positiva e decidi focar no que poderia dar certo ao invés do contrário. Eu também me respeitei em cada momento: de dor, de esperança e de seguimento.

RMC – O livro “Panapaná”, que você lançou recentemente, retrata essa fase do tratamento? Porque a decisão de escrever o livro?

NB – O livro foi uma espécie de catarse de toda aquela fase desafiadora em que eu estava sendo submetida, mas também uma forma de mostrar para as pessoas que não precisa ser fácil, basta ser possível.

RMC – Como foi receber o diagnóstico de cura? O que acredita que tenha influenciado positivamente no sucesso do tratamento?

NB – A informação e a procura precoce de uma ajuda médica são importantíssimas para uma desfecho de sucesso, mas definitivamente, minha fé me curou! A minha cura foi somente uma das bênçãos de Deus que obtive ao atravessar tudo. Existe um crescimento pessoal, social, espiritual enorme ao se passar por isso.

RMC – Até que ponto o envolvimento de familiares e amigos é importante durante o tratamento?

NB – É fundamental! Eu diria que sem isso poderia até ter sido possível, porém bem mais difícil. E porque complicar uma fase já tão desafiadora, né? Um conselho que eu daria é: se alguém que você ama vai atravessar esse deserto, ofereça sua mão, ele lhe retornará seu coração.

RMC – Além do livro, essa fase da sua vida lhe rendeu outro compromisso, que você chama de “Borboletas”. O que é o projeto Borboletas e o porquê desse nome?

NB – Quando adoeci quis ser eu mesma a portadora da notícia e escrevi um texto para explicar para as minhas amigas a real situação. Ali, eu falei que atravessaria um deserto, mas que tinha certeza que encontraria vários oásis com borboletas no meio do caminho e um arco-íris no final. Foi uma espécie de profecia que elas se lançaram sem ressalvas, pois não mediram esforços em me confortar, amparar, mimar, interceder e caminhar comigo junto à vitória final. Não houve um só dia desse deserto em que eu estivesse sozinha. Foi amor em forma de caridade, de amizade, de proteção, de oração e de sublimação. Após a minha cura, achei que o projeto era muito grandioso, eu diria fantástico, e que não poderia acabar em mim. Então as convidei pra dar continuidade àquela ideia divina em outros jardins, agora eu também sendo uma das minhas 50 borboletas-anjos amadas. Hoje temos mais de 30 “mimados” portadores de câncer, como um dia eu fui.

RMC – Como o projeto ajuda outros pacientes?

NB – Nós rezamos intercedendo por cada um deles, temos uma escala de borboletas responsáveis pela distribuição de mimos diários (presentinhos para alegrar e também para lembrar aos pacientes que existem alguém, que mesmo por vezes não o conhecendo, o ama e se importa com ele), além de ações sociais de caridade. Então se formou nosso tripé: oração, ação e doação.

RMC – Acredita ainda que falta informações sobre o câncer e sua cura?

NB – Muito! A informação faz parte da cura! Apesar do Gianechini e da Dilma terem sido pacientes famosos portadores de linfoma, hoje 86% da população brasileira não sabe que linfoma é câncer e quais seriam seus sintomas. Quando não se sabe do que se trata, mais difícil fica procurar ajuda médica.

RMC – Após essa fase já voltou a fazer as mesmas atividades?

NB – Já. Muitas delas. Porém ainda não retornei ao meu consultório, minha paixão em forma de profissão, o que planejo fazê-lo em breve, mas quando se atravessa uma fase dessas nunca se volta a ser o mesmo. A gente se torna maior e mais forte do que um dia imaginou ser.

RMC – O que mudou após a descoberta e cura da doença?

NB – Mudou a minha percepção de finitude, o entendimento de que não temos controle de tudo e principalmente que o pouco que a gente pode fazer é muito para quem precisa.

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